Pages

TRADUTOR

Tuesday, March 29, 2011

QUARENTA ANOS








A vida é pra mim, está se vendo,
uma felicidade sem repouso;
eu nem sei mais se gozo, pois que o gozo
só pode ser medido em se sofrendo.
Bem sei que tudo é engano, mas sabendo
disso, persisto em me enganar... Eu ouso
dizer que a vida foi o bem precioso
que eu adorei. Foi meu pecado... Horrendo
Seria, agora que a velhice avança,
que me sinto completo e além da sorte,
me agarrar a esta vida fementida.
Vou fazer do meu fim minha esperança,
Oh sono, vem!... que eu quero amar a morte
com o mesmo engano com que amei a vida.







Poema: M
ário de Andrade

Arte: Tom Colbie

Friday, March 25, 2011

MINHA LINDA AMANTE DAS NUVENS





Breu é quando tu te afastas ou dizes
Que viajas...
Hilda Hilst


minha linda
amante das nuvens
move-se em perfumes
& não me ama

perdida no tempo
rara & feita
de uma esperteza dos céus
rarefaz-me

& esbelta
trama, ri, espreita
a controlar gestos
por entre véus

sei que caça seu amor pelos ares
(quem sabe em todos os lugares)

bem perto da noite
que me funde a seu breu

manipula o vento
com os dedos lisos
a quem nada escapa

nem o pássaro
que passa









Poema: Marcello Chalvinski
Arte: Tom Colbie

CARTA AO POETA PASTORI







amigo,
meu coração se apertou descompassado

estive triste colhendo ocasos

aquelas borboletas na janela
aprisionaram crisálidas sem tempo
& invadiu o meu sótão
uma miríade de ratos

meu coração apertado
tingido de paixões
bombeou aos vis pulmões
o sangue quentenacarado

tornei-me refém de tubarões
no oceano do inimaginado

mas

antes que o último coqueiro
tombe sobre o último poema
caminharemos abraçados
de panaquatira à piatã

frustraremos automóveis dissonantes
incendiaremos bancas de revista
& mijaremos na fogueira
de todas as vaidades

estive triste colhendo ocasos

mas o acaso quis
que dentro do poema
houvesse ânimo
amizadegasolina

era outubro ou nada

beijei minha baby vestal
& lancei mão
de minha escopeta de idéias

disparei inclemente
contra os demônios
que infeccionavam minhas manhãs
&
cheio de manhas
derrotei meus torpes algozes

foi bom
que ao menos em carta
tenhas vindo
és cantante
& é doce estar contigo

amigo
meu coração se apertou descompassado

mas os dias
nem sempre começam
tão bem quanto terminam









Poema: Marcello Chalvinski 
Arte: Tom Colbie

O DEFUNTO




Quando morto estiver meu corpo,
Evitem os inúteis disfarces,
Os disfarces com que os vivos,
Só por piedade consigo,
Procuram apagar no Morto
O grande castigo da Morte.

Não quero caixão de verniz
Nem os ramalhetes distintos,
Os superfinos candelabros
E as discretas decorações.

Quero a morte com mau-gosto!

Dêem-me coroas de pano,
Angustiosas flores de pano,
Enormes coroas maciças,
Como enorme salva-vidas,
Com fitas negras pendentes.

E descubram bem minha cara:
Que a vejam bem os amigos.
Que não a esqueçam os amigos
Que ela ponha nos seus espíritos
A incerteza, o pavor, o pasmo.
E a cada um leve bem nítida
A idéia da própria morte.

Descubram bem esta cara!

Descubram bem estas mãos
Não se esqueçam destas mãos!
Meus amigos, olhem as mãos!
Onde andaram, que fizeram,
Em que sexos demoraram
Seus sabidos quirodáctilos?

Foram nelas esboçados
Todos os gestos malditos:
Até os furtos fracassados
E interrompidos assassinatos.

- Meus amigos! olhem as mãos
Que mentiram às vossas mãos...
Não se esqueçam! Elas fugiram
Da suprema purificação
Dos possíveis suicídios.

- Meus amigos, olhem as mãos!
As minhas e as vossas mãos!

Descubram bem minhas mãos!

Descubram todo o meu corpo.
Exibam todo o meu corpo,
E até mesmo do meu corpo
As partes excomungadas,
As sujas partes sem perdão.
- Meus amigos, olhem as partes...
Fujam das partes,
Das punitivas, malditas partes...

Eu quero a morte nua e crua,
Terrífica e habitual,
Com o seu velório habitual.

- Ah! o seu velório habitual!

Não me envolvam em lençol:
A franciscana humildade
Bem sabeis que não se casa
Com meu amor da Carne,
Com meu apego ao Mundo.

Eu quero ir de casimira:
De jaquetão com debrum,
Calça listrada, plastron...
E os mais altos colarinhos.

Dêem-me um terno de Ministro
Ou roupa nova de noivo...
E assim solene e sinistro,
Quero ser um tal defunto,
Um morto tão acabado,
Tão aflitivo e pungente,
Que sua lembrança envenene
O que resta aos amigos
De vida sem minha vida.
- Meus amigos, lembrem de mim.
Se não de mim, deste morto,
Deste pobre terrível morto
Que vai se deitar para sempre
Calçando sapatos novos!

Que se vai como se vão
Os penetras escorraçados,
As prostitutas recusadas,
Os amantes despedidos,
Como os que saem enxotados
E tornariam sem brio
A qualquer gesto de chamada.

Meus amigos, tenham pena,
Senão do morto, ao menos
Dos dois sapatos do morto!
Dos seus incríveis, patéticos
Sapatos pretos de verniz.
Olhem bem estes sapatos,
E olhai os vossos também.














PEDRO NAVA

Thursday, March 24, 2011

VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA



(Da Série Influências)






Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei



Vou-me embora pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz

Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconseqüente

Que Joana a Louca de Espanha

Rainha e falsa demente

Vem a ser contraparente

Da nora que nunca tive



E como farei ginástica

Andarei de bicicleta

Montarei em burro brabo

Subirei no pau-de-sebo

Tomarei banhos de mar!

E quando estiver cansado

Deito na beira do rio

Mando chamar a mãe-d'água

Pra me contar as histórias

Que no tempo de eu menino

Rosa vinha me contar

Vou-me embora pra Pasárgada



Em Pasárgada tem tudo

É outra civilização

Tem um processo seguro

De impedir a concepção

Tem telefone automático

Tem alcalóide à vontade

Tem prostitutas bonitas

Para a gente namorar



E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito

Quando de noite me der

Vontade de me matar

— Lá sou amigo do rei —

Terei a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada.






Poema: Manuel Bandeira
Arte:Tom Colbie

.

Monday, March 21, 2011

O AMOR










Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine. E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios, e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria. E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria. O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal; Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade; Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor nunca falha; mas havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, cessarão; havendo ciência, desaparecerá; Porque, em parte, conhecemos, e em parte profetizamos; Mas, quando vier o que é perfeito, então o que o é em parte será aniquilado. Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como menino, mas, logo cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino. Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido. Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor.








(I CORÍNTIOS 13)

LILITCHKA!








Lilitchka!
(em lugar de uma carta)



Fumo de tabaco roi o ar.
O quarto -
um capítulo do inferno de Krutchónikh.
Recorda -
atrás desta janela
pela primeira vez
apertei tuas mãos, atônito.
Hoje te sentas,
no coração - além.
Um dia mais
e me expulsarás,
talvez com zanga.
No teu "hall" escuro longamente o braço,
trêmulo, se recusa a entrar na manga.
Sairei correndo,
lançarei meu corpo à rua.
Transtornado,
tornado
louco pelo desespero.
Não o consintas,
meu amor,
meu bem,
digamos até logo agora.
De qualquer forma
o meu amor
- duro fardo por certo -
pesará sobre ti
onde quer que te encontres.
Deixa que o fel da mágoa ressentida
num último grito estronde.
Quando um boi está morto de trabalho
ele se vai
e se deita na água fria.
Afora o teu amor
para mim
nãomar,
e a dor do teu amor nem a lágrima alivia.
 
Quando o elefante cansado quer repouso
ele jaz como um rei na areia ardente.
Afora o teu amor
para mim
nãosol,
e eu não sei onde estás e com quem.
Se ela assim torturasse um poeta,
ele
trocaria sua amada por dinheiro e glória,
mas a mim
nenhum som me importa
afora o som do teu nome que eu adoro.
E não me lançarei no abismo,
e não beberei veneno,
e não poderei apertar na têmpora o gatilho.
Afora
o teu olhar
nenhuma lâmina me atrai com seu brilho.
Amanhã esquecerás
que eu te pus num pedestal,
que incendiei de amor uma alma livre,
e os dias vãos - rodopiante carnaval -
dispersarão as folhas dos meus livros...
Acaso as folhas secas destes versos
far-te-ão parar,
respiração opressa?
Deixa-me ao menos
arrelvar numa última carícia
teu passo que se apressa.






...

Vladimir Maiakoviski
26 de maio de 1916. Petrogrado

Wednesday, March 16, 2011

DEFININDO SENTIMENTOS






Saudade: é quando o momento tenta fugir da lembrança para acontecer de novo e não consegue.


Lembrança: é quando, mesmo sem autorização, seu pensamento representa um capítulo.


Angústia: é um nó muito apertado bem no meio do sossego.


Preocupação: é uma cola que não deixa o que ainda não aconteceu sair de seu pensamento.


Indecisão: é quando você sabe muito bem o que quer, mas acha que devia querer outra coisa.


Certeza: é quando a idéia cansa de procurar e para.


Intuição: é quando seu coração dá um pulinho no futuro e volta rápido.


Pressentimento: é quando passa em você o trailer de um filme que pode ser que nem exista.


Vergonha: é um pano preto que você quer pra se cobrir naquela hora.


 Ansiedade: é quando sempre faltam muitos minutos para o que quer que seja.


Interesse: é um ponto de exclamação ou de interrogação no final do sentimento.


Sentimento: é a língua que o coração usa quando precisa mandar algum recado.


Raiva: é quando o cachorro que mora em você mostra os dentes.


Tristeza: é uma mão gigante que aperta seu coração.


Felicidade: é um agora que não tem pressa nenhuma.


Amizade: é quando você não faz questão de você e se empresta pros outros.


Culpa: é quando você cisma que podia ter feito diferente, mas geralmente, não podia.


Lucidez: é um acesso de loucura ao contrário.


Razão: é quando o cuidado aproveita que a emoção está dormindo e assume o mandato.


Vontade: é um desejo que cisma que você é a casa dele.


Paixão: é quando apesar da palavra "perigo" o desejo chega e entra.


Amor: é quando a paixão não tem outro compromisso marcado.


Não. Amor é um exagero... Também não.


Um dilúvio, um mundaréu, uma insanidade, um destempero, um despropósito, um descontrole, uma necessidade, um desapego?


Talvez porque não tenha sentido, talvez porque não tem explicação, esse negócio de amor... não sei explicar!







Mario Prata


Arte: TOM COLBIE








.







Tuesday, March 15, 2011

O MANUAL DA ALMA FEMININA*




ZETH – MANUAL DA ALMA FEMININA
Organização Joey Schatten



“Há um espelho que me viu pela última vez,
Há uma porta que fechei até o fim do mundo.
Entre os livros da minha biblioteca (estou vendo-os)
Há algum que já nunca abrirei. “

Jorge Luis Borges




Prelúdio




            Depois da morte do Supremo, houve o grande êxodo dos anjos, quando as regiões celestiais se tornaram sete. Bruxos, profetas e padres dividiram a terra em milhares de religiões. Mil religiões buscavam a primeira potestade, cultuando o Vazio por acreditar na ressurreição do Supremo. Outras mil cultuavam a Plenitude e buscavam a harmonia com o Contrário. De resto, cada região disputava almas apenas para obter capital político e cumprir o jogo das profecias.
Sobre a terra, os homens foram submetidos a experiências sem igual. Como parte de um jogo mórbido onde não há regras, diversas almas foram experimentadas por anjos obsessivos. Sem a existência do Supremo, as faltas e os pecados não podiam mais ser estabelecidos com precisão e até mesmo os mais fiéis agiam como quem canta uma música sem conhecer-lhe a letra.
Desespero, ambição, prazer e obsessão perseguiram várias almas antes livres de tentações. Demônios e anjos moviam com dedos etéreos seus títeres sombrios, soldados da sorte insondável. No meio de toda turbulência, entretanto, sempre haveria alguém a quem o Destino iria permitir eternamente o reinício do jogo.
Bem ou mal, sorte ou azar, vida ou morte, paraísos ou infernos pareciam não dizer muita coisa a estes jogadores sem deus. No seio lascivo da boêmia, entretanto, um deles surpreenderia o próprio destino confundindo anjos e demônios indiferentemente. Seu nome era Kadmon.




I



                        Kadmon era um espírito da noite. Incendiário e apaixonado, ardia numa fome bandida pelo êxtase da conquista. Loção de barba, baba e poesia engendravam seus gestos e batimentos cardíacos. Ele mesmo nunca soube quando, nem de que modo. Mas o fato é que adquirira forte obsessão pelos íntimos mistérios da alma feminina. Lobo das estepes urbanas era, por assim dizer, um caçador solitário que surgia da névoa do nada para sangrar suas presas mais ou menos indefesas e falsas.
            Seus sentidos freqüentavam paraísos artificiais, em viagens cada vez mais intensas na ida e mais fatigantes na volta. Bar em bar, esbórnia em esbórnia, mantinha-se preso a sedas, corações e lingeries de tal arte, que era de pensá-lo uma espécie de vampiro.
Kadmon atava-se a lençóis na luz do dia, urdindo sonhos alucinados. Foi assim que, ainda exalando uísque, acordou de um pesadelo envolto em insetos de verão.
Tinha se visto só, a caminhar por uma rua estranhamente próxima e totalmente desconhecida. Não identificava uma esquina sequer. No entanto, com a calma habitual, tratou de pôr um passo após o outro, molhando a garganta aqui e ali.
Um gato vadio que errava pela rua arrastou seu olhar até uma obscura vitrine. “Voz de Tântalo Livraria” – o nome lavrado no vidro, com letras esguias e intrigantes fez seus olhos brilharem num acesso de curiosidade quase infantil. O aproximar-se foi inevitável. Como uma seta que encontra o alvo, seu olhar cravou-se no título que emergia do mar de livros que se derramava das prateleiras. As letras, que via tatuadas na capa de finíssimo couro, faziam-no girar dentro de si.
Era um anjo colhendo espíritos. Era um vento que desafiava o tempo. Era o tempo que destronava deuses. E era santo, semideus, rei e demônio. Era o próprio destino inexorável na correnteza do pleroma universal.
            Enquanto seu corpo febril inundava os lençóis e se contorcia, sua visão viajava no delírio do sono e decifrava na capa do livro inatingível o letreiro que envolvia o bálsamo de todas as suas inquietações. Era um livro não muito grande, nem parecia muito pesado. E estava lá, à sua frente, separado apenas pela fina vitrine do sonho.
Manual da Alma Feminina era o título. Por mais que se esforçasse, porém, não conseguia ler o nome do autor. A curiosidade e o desejo se apoderavam dele como uma febre transbordante.
Tomado de tremores e calafrios dirigiu-se à porta, que estava trancada. Mesmo com o pensamento fixo no livro, não pôde deixar de observar a solidez da madeira escura cheia de entalhes ordinários representando orgias, homens a chocar pedras, mulheres com olhos nos seios e um enorme pássaro com cornos na cabeça, cujas asas envolviam a tudo.
Recuou por um momento. Esvaziou a garrafa com a alma ardendo e lançou-a contra a vidraça. Ato contínuo, os estilhaços cravaram-se em seu corpo causando dores e agonias tão intensas que, neste instante, ele acordou. Banhado de suor, em meio aos lençóis revoltos, Kadmon percebeu que estava coberto por uma nuvem asquerosa de insetos fétidos e avermelhados. Procurou manter-se calmo. Levantou-se lentamente, tomou um copo d’água e só então deflagrou o inseticídio.




II



                        Os dias se passavam e o sonho não lhe saía da cabeça. Como poderia ele possuir o Manual da Alma Feminina e dominar, assim, todos os segredos do íntimo das mulheres? Precisaria, talvez, mergulhar novamente no profundo desvario do sono, para tentar capturar o livro. Mas, ainda que o conseguisse, de que forma transporia a fronteira do real, mantendo em seu poder o cobiçado objeto? Não havia resposta plausível para nenhuma de suas perguntas.
            Enquanto o tempo arrastava seu manto pastoso, as noites se sucediam na rotina dos bares incendiados de poesia, amores e perdições. Entre um trago e outro, Kadmon tentava desenhar nos guardanapos as formas que vira entalhadas na porta, mas as farras roubavam-lhe as imagens da memória.
Ora aflito, ora deprimido, consolava-se no leito de suas amantes mais belas e fúteis. Durante o dia, ocupava-se de antigas fotos da cidade, tentando em vão descobrir a estranha rua que o levara aos limites do êxtase e da privação.
Certa noite, porém, saiu de casa de um modo diferente. Mais preocupado e cauteloso do que de hábito, caminhou lento e observador. Evitou as bodegas de sempre e foi dar numa espelunca azulada, onde, apelando para sua lábia, aproximou-se Nádia.
            Flor doce e exótica, a garota trazia consigo um feixe de conversas enigmáticas, seios rijos, baseados e um perfume inebriante. Ao dançar, fazia com que suas roupas de tecidos diáfanos espelhassem o brilho lascivo de sua alma indômita.
Kadmon desejou-a com tanta intensidade que o suor brotou-lhe do peito e o tempo, então, abrandou o caminhar. O ritual de sedução destilava luxúria, contagiando vampiros, boêmios e moças.
A espeluca azulada agora era palco de um bailado dionisíaco. Certeiro, Kadmon tomou a garota pela cintura, comprimindo-a fortemente contra si. Respirou fundo para sorver o cheiro que manava de seu corpo e num gesto ousado, reclinou-a para sugar-lhe o seio. Foi quando viu, incrédulo, a tatuagem de um pássaro, igual ao que vira em sonho, entalhado na porta da livraria.
Nádia cobriu-se com as mãos e afastou-se com uma expressão aterrorizada. Houve muita confusão. Estróinas e putas voaram sobre Kadmon atacando-o a chutes, socos e bofetões. Tonteando em meio à turba enfurecida, ele pôde ver, ainda no ar, a garrafa que se projetou contra seu crânio. No exato momento do impacto, ele desmaiaria.




III



            A espelunca vazia recebia um vento úmido e tedioso. O assoalho de tábuas corridas repleto de garrafas, copos e baganas testemunhava um despertar lento e penoso. Virando-se com as costas para o chão, Kadmon ponderou que a pequena dor que sofria, não correspondia ao enorme hematoma em sua testa.
Passou algum tempo sem se mover, reconstituindo cuidadosamente o mosaico de suas lembranças. Quando por fim se levantou, a madrugada anunciava o novo dia, que por certo lhe seria doloroso e depressivo. Catou um cigarro no chão, acendeu-o e sorriu ao encontrar, na saída, uma garrafa de seu uísque favorito.
Na rua deserta, entornou bebida sobre o ferimento e seguiu sentindo-se melhor, a cada gole. Subitamente feliz, atravessava poças d’água arrastando os pés numa dança demente. A camisa em farrapos ainda exalava o perfume de Nádia, que ele inalava com um prazer quase masoquista.
            Esmou pelos becos como um náufrago à deriva. Não ouvia um som. Não via ninguém. Seus pensamentos desaguavam num oceano de reticências ou, talvez, estivesse conseguindo realmente não pensar em nada.
Virou a esquina olhando para o gato que o fitava do telhado. Como se fosse óbvio, estancou no meio da rua para sorver um imenso trago. Enxugou a boca com as costas das mãos e começou a se dar conta do local onde estava.
O gato, passando à sua frente, pousava macio no beiral de uma vitrine onde se lia em letras esguias e intrigantes: Voz de Tântalo Livraria. Kadmon aproximou-se da porta, com as sobrancelhas içadas. Iria empurrá-la, mas ela cedeu antes mesmo que a tocasse.
No interior da livraria, ecoavam sopros de flauta. Com passos silenciosos, deslocou-se em meio às estantes procurando o tão sonhado livro. Não o achou. Virou-se e decidiu seguir prédio adentro. Encontrou uma extensa escadaria, comprimida por agressivas paredes de pedra.
Logo de início pôde ver que, a certa altura, os degraus se inclinavam a ponto de fazê-lo acreditar que a escada se tornava perpendicular ao chão. Dominando o medo, decidiu descer até o fim. Sentindo-se fora de seu eixo, chegou a uma grande sala triangular, com uma espécie de piscina em forma de pentágono, ao centro. Sobre ela, suspensa por poderosas correntes, pairava completamente vazia uma gaiola de estilo grego.
            No vértice mais profundo da sala, Kadmon divisou o livro. Ele parecia flutuar sobre um monólito negro. Correu ansioso até ele, ferindo o ombro na parede rochosa. Deitou dedos ardentes sobre o objeto de seu desejo, mas ouviu de imediato um som ensurdecedor.
Virando-se rapidamente viu surgir na gaiola um pássaro como o que vira no entalhe da porta. O monólito desceu até o piso e o vértice se abriu revelando lentamente uma sala oval, onde homens nus de membros eretos chocavam pedras, atados à parede por pesados grilhões.
No centro, com um lampião pendendo sobre a cabeça, estava Nádia. Nua, mantinha-se sentada sobre os calcanhares. Seus olhos, de tão negros, pareciam não ter pupilas.
Kadmon sentiu-se, de súbito, livre de toda ansiedade. Alçou-a com uma das mãos e beijou-lhe a boca longamente. Houve um leve estremecimento e as paredes, então, começaram a sangrar pelas frestas pedregosas.
Desprendendo-se repentinamente de Nádia, Kadmon procurou na capa o nome do autor. Era o seu.
– É isso o que tanto desejas? – perguntou ela, exalando um hálito repugnante de mênstruo. O pássaro emitia sons terríveis e se debatia com tanta força que estava prestes a romper as grades da gaiola.
Vendo a condição absurda de tudo que acontecia ao seu redor, Kadmon apavorou-se. De um salto partiu em direção às escadas. Esgueirou-se pela borda da piscina e correu o mais que pôde.
Afoito, perdeu o equilíbrio e tombou deixando o livro escapar-lhe das mãos. Com o gosto amargo do medo impregnado na língua, sequer pensou recuperá-lo. Correu velozmente até à porta de saída, mas deparou-se novamente com Nádia. Segurando o livro entre as mãos, ela perguntou-lhe se não era aquilo o que mais desejava. Incontinenti, K empurrou-a e precipitou-se rua afora correndo como um louco.
De todos os cantos, centenas de gatos se projetavam em sua direção e algo como um terremoto abalava toda estrutura da rua. Prédios rangiam e paredes desabavam. O medo aumentava. Mais uma esquina e Kadmon alcançaria os bares tão conhecidos de sua intimidade. Bares que agora pareciam ser a sua única tábua de salvação.
Vendo o chão abrir-se à sua frente, tentou ainda um salto, mas suas forças o abandonaram. No ápice do desespero, sentiu seu grito se perder no vórtice do abismo. Então, para seus olhos, o mundo inteiro escureceu.


  

IV




                        As luzes voltariam muito depois, trazendo, a princípio, formas estranhas e incompreensíveis. Sua visão custou a ajustar-se, mas ele reconheceu de pronto a voz doce e feminil, que em dado momento soou enfática:
– Eu ainda posso beber mais uma.
            Tudo estava claro. Kadmon despertava do seu estranho coma, em plena mesa de bar. Passou a mão pela testa procurando o hematoma, mas nada encontrou. A seu lado, a bela Nádia brindava com amigos, irradiando milhões de luzes com seu sorriso. Pareceu-lhe certo acreditar que tudo não passara de um sonho.
– Uma mineral e um uísque – pediu ele, tentando refazer-se por completo.
– Ah! Meu príncipe está vivo! – exclamou Nádia, com grande alegria – Pensávamos que você não ia acordar mais...
A noite atravessou risos, porres e poesia. Quando a madrugada exalou seu hálito frio, Kadmon tinha Nádia em seus braços. Partiram para o apartamento dela, mastigando gemidos temperados de calor e erotismo. Subiram as escadas, lado a lado, como se fossem antigos amantes.
Nádia girou a chave na porta e, com passos felinos, penetrou no apartamento. Deliciosamente terna, beijou Kadmon nos lábios e depois nos olhos, deixando pequenas marcas de batom.
            Ele, entorpecido, fechou a porta atrás de si, sem notar que na parte interior havia um sem-número de entalhes, que pareciam conter um emaranhado de lendas. De um jeito quase-sem-querer, Nádia deixou cair o vestido dando à luz seus seios fortes, que tinham um olhar agudo, devorador de homens.
Havia um cheiro a mais no ar que respiravam. Um odor marrom, morno e adocicado. As mãos, como ávidos nômades a percorrer a geografia dos corpos, transpiravam desejos inconfessos, ardentes e desmesurados.
O suor se derramou profusamente pelos os lençóis amarfanhados e a inércia conquistou um espaço, logo roubado pelo sono. Nádia esperou que Kadmon acordasse para apresentar-lhe as gêmeas Flávia e Liz. Do jeito mais carinhoso que pôde, explicou o imenso desejo de vê-lo na cama com as amigas.
Por sete dias e sete noites, Kadmon deitou-se com elas. Meticulosamente, desvendou seus corpos e mastigou suas palavras, nutrindo-se de pensamentos e sonhos. Durante este tempo, ficou sem ver a cidade. Sentia, vez ou outra, um cheiro de peixe que se emaranhava nos filamentos de ar salgado que penetravam pela janela.
Quando a segunda lua de julho atingiu seu ponto máximo no alto da noite, Kadmon pela primeira vez achou-se sozinho. Uma magreza que beirava a esqualidez havia se apoderado do seu corpo e uma série de perfurações no púbis compunham uma cicatriz perturbadora.
Caminhou pelo quarto exalando testosterona e encontrou várias peças de roupa, inclusive as suas, atiradas pelo chão. Em meio a elas, deu com um antigo livro intitulado Canção da Valáquia Beatrix e do Vóivoda Malescu.
As antigas iluminuras contidas na obra retratavam conciliábulos de feiticeiros e bruxas, onde o sexo e o canibalismo eram festejados com vinho e haxixe. Não chegou a ler o que continha, pois, erguendo os olhos como quem procura a origem de um som, deparou-se com um intrigante espelho poligonal.
No primeiro vértice do espelho havia um signo que emprestava ao reflexo do seu rosto um bronzeado de verão. No segundo, mirava-se pálido, outonal. No terceiro, que se quebrava e se recompunha infinitamente, via-se entre flores de primavera. O quarto e recurvado vértice atraiu sua atenção com um imã invisível. Nele, viu projetado sobre seu rosto um poema carregado de raios e trovões.
Refletindo algum ponto distante, o centro do espelho mostrava claramente o anagrama:
Nahtriheccunde
Gahinneverahtunin
Zehgessurklach
Zunnus.
– A alma feminina possui apenas duas faces. Mas, uma delas é mais que três...
            A voz de Nádia, vinda do fundo do quarto, soou tão estranha, que ele enregelou-se. Olhando-a mais agudamente que o costume, percebeu que os dois lados de seu rosto eram exatamente iguais. Sentiu-se como se despertasse de um longo transe. Nada fazia sentido. Não entendia porque estava ali.
Uma imensa confusão formou-se em sua mente. Tentou fechar-se em seus pensamentos e teria divagado mais uma centena de anos, não fosse o golpe frio das palavras de Nádia atingi-lo novamente:
– Compreender o manual, depende da ordem em que as páginas masculinas e femininas se sucedem, para cada leitor. Vamos pra cama, que eu te mostro meu pentagrama – disse Nádia, estendendo-lhe o braço com ar debochado.
Kadmon tentou recusar, mas faltou-lhe jeito. Deitado ao lado de Nádia, começou a sentir as carícias das gêmeas que o beijavam na nuca e nos ombros. Assim, sem vê-las, passou a tocá-las intimamente até virar-se e perceber que sangravam pelos mamilos.
Assustado, levantou-se de um salto e tratou de se vestir. As três mulheres desataram em gargalhas estrepitosas, que ecoavam em sua cabeça como as badaladas de um sino. Sem dizer palavra, precipitou-se pela porta, desceu as escadas em desespero e saiu do prédio sem saber aonde ir. De tanta fraqueza, desequilibrava-se a todo instante. Quando por fim faltaram-lhe as pernas, tombou com a face voltada para cima e viu o céu avermelhar-se e escurecer completamente.
            Em seu sono comatoso, Kadmon estava livre e bem. Sonhava-se um príncipe a bailar galante no salão dos mais desejados corações femininos. A cada passo, a cada giro, um novo amor surgia e fortalecia o seu poder de encantar. Via os dias e as noites passarem com incrível velocidade e, de tantas seduções e conquistas, passou a viver num mundo de mimos, cercado de luxo e luxúria. Muitas e muitas mulheres o visitavam em busca de romance, da voracidade de seu sexo, de conselhos e até de palavras de consolo. Kadmon atendia a todas, quase sempre as satisfazendo com egoísmo camuflado em falsa generosidade. Contudo, não lhe atormentava nenhuma culpa e sua vida parecia-lhe doce e harmônica.
            Seu grande medo, porém, estava no fato de que alguém pudesse roubar-lhe o manual. Ainda que o guardasse a sete chaves, era obrigado a cumprir o ritual de ler duas páginas ímpares, nos dias femininos e uma página par, nos dias que têm barba, para que não perdesse os conhecimentos. Assim, todas as vezes que adentrava o local construído para abrigar o livro, era tomado de uma extrema ansiedade, que o fazia suar debaixo dos cabelos. Certa feita, ao chegar na última página ímpar do livro – de onde é  necessário retornar ao início fazendo a leitura em voz alta e subtraindo os substantivos –,  uma gota de suor fétido como enxofre escorreu-lhe pela testa.
            Ao tocar o livro, o pingo se espalhou tingindo de vermelho o alto da página, onde se lia “Gazel da Faca de Sal”. Uma fumaça tóxica de odor insuportável começou a sair das páginas femininas do Manual, que ardeu numa enorme chama, ateando fogo ao seu corpo. Contorcendo-se de dor, ele emitiu urros pavorosos e cobriu a face com as mãos, até que num supremo esforço abriu os olhos para o seu anjo.




V




                        Novamente as luzes embaçadas de mais um despertar confuso e doloroso foram dando contorno à sua possível realidade. Do leito onde se encontrava, pôde divisar algum movimento de médicos e enfermeiras. Percebeu agulhas em suas veias e sentiu a desagradável sensação causada por um tubo em seu nariz.
Depois de algum tempo de letargia, moveu a cabeça a fim de olhar para os lados e, com inexprimível esforço conseguiu sentar-se. As vozes foram chegando lentamente, amarradas a outros sons e transportadas pelo ar gelado, carregado de éter.
Duas enfermeiras se aproximaram de um leito próximo, onde um homem muito gordo recebia oxigênio e tinha os batimentos cardíacos monitorados. Mesmo atordoado, Kadmon reconheceu os rostos de Flávia e Liz.
Quando Liz desligou os aparelhos, o homem no leito começou a se agitar em convulsões tão violentas que faziam ranger o móvel de ferro. Flávia desabotoou o vestido e colocou o seio esquerdo próximo à boca do doente, fazendo-o engasgar-se com o sangue que esguichava em profusão.
Kadmon desvencilhou-se dos tubos e agulhas com um gesto rápido e tentou fugir, mas foi placidamente detido por um médico que com muito jeito cuidou de acalmá-lo. Kadmon tentou contar-lhe do paciente ao lado, mas, ao virar-se, percebeu que tudo estava em ordem.
Confuso e sem saber o que falar viu F e L saírem tranqüilamente do recinto enquanto o médico falava de sua transferência para uma enfermaria comum, aos cuidados de uma médica que definira como nova, mas muito competente.
            O trajeto para o novo leito foi feito por meio de um atendente muito velho, que o levou em cadeira de rodas. Os corredores eram tão iluminados que Kadmon mal podia manter os olhos abertos. As lembranças do apartamento de Nádia vinham em fragmentos a um tempo gostosos e aterrorizantes, de tal arte que não conseguia mais distinguir o prazer do medo que sentira.
Instalado sozinho numa enfermaria repleta de leitos vazios, Kadmon sentiu-se seguro para relaxar e dormir. Quando despertou, alongou-se preguiçosamente e sentiu que as forças lentamente voltavam a animar-lhe o corpo. Indagava de si mesmo até que ponto o que lhe parecia lembrança era real. Neste momento, viu aproximar-se uma mulher de curvas sinuosas, vestida como se vestem os médicos. De cabelos presos e com a cabeça baixa a ler o que lhe pareceu um prontuário, só deixou ver-lhe o rosto assim que se postou ao seu lado, indagando.
– Sr. Kadmon, Adam Kadmon... é isto?
            Kadmon assentiu com a cabeça, tomado de mutismo ao ver na médica o rosto de Nádia.
– Meu nome é Nádia Malescu... Doutora Nádia. Espero que o senhor esteja se sentindo bem e que possa falar – disse ela, com um sorriso pueril pendendo dos lábios.
– Sim, acho que posso e... bem, já me sinto melhor... ou pelo menos sinto, já que não sei se sentia antes e nem compreendo o que me aconteceu. Tive sonhos estranhos e ...
– Isso é muito normal, para quem esteve em coma. Talvez falte-lhe memória de algumas coisas e é provável que as medicações, bem como seu próprio estado lhe tragam alguma confusão mental...
– Mas o que houve, por que eu...
– Consta da ocorrência que o senhor foi encontrado desacordado nas ruínas de um antigo casarão da cidade velha, na manhã do dia 1º de novembro...
– Ruínas? E a livraria e o teu apartamento e as gêmeas?
– Não entendo o quê o senhor está falando, provavelmente...
– Provavelmente, o caralho – gritou Kadmon, enfurecendo.
            A médica calou-se, recuando alguns passos enquanto ele desaguava um rio de impropérios. Com um gesto sutil ela chamou um musculoso atendente que imobilizou Kadmon, para que duas enfermeiras gêmeas lhe administrassem um sedativo. Mais uma vez ele mergulhou na escuridão.
– Sr. Kadmon... Sente-se bem? Sr. Kadmon?
            A voz suave fez com que ele despertasse num clima de tranqüilidade celestial. Estava descansado e, de fato, sentia-se muitíssimo bem. Após conversas bastante sinceras e amenas com a Dra. Nádia, acabou por aceitar como realidade, o raciocínio lógico que ela lhe tecera em torno dos fatos narrados por ele.
Como parecesse bem física e mentalmente, a doutora avisou-lhe da alta. Sem esconder seu interesse e novamente nutrido de sua habitual verve, Kadmon confessou à médica que queria vê-la novamente, “em circunstâncias mais agradáveis”. Mais ou menos tímida, ela concordou em dar a ele o número de seu telefone.
            Indo a seu encontro, poucos dias após deixar o hospital, Kadmon transpirava desejos. Incendiário e apaixonado, ardia numa fome bandida pelo êxtase da conquista. Loção de barba, baba e poesia engendravam seus gestos e batimentos cardíacos.
Vez por outra tocava a mão sobre o bolso do casaco onde abrigava sua garrafa de uísque. Andando rapidamente no bairro que tão bem conhecia, surpreendeu-se ao se ver de súbito em uma rua que lhe era totalmente estranha. Não identificava um prédio, uma casa, uma esquina sequer.
De todo modo, não se amedrontou. Estava certo de que seus antigos devaneios estavam superados e não voltariam jamais. Tratou de pôr um passo após o outro, molhando a garganta aqui e ali. Então, um gato vadio, que errava pela rua, chamou repentinamente a sua atenção, como o fazem as belas mulheres, e arrastou seu olhar agudo até uma obscura vitrine.






*Excerto do livro “O PLANO”, de Marcello Chalvinski. Prêmio G. Dias de Literatura – SECMA 2008

Tira-gosto