Jardim das Maravilhas
Saturday, November 30, 2019
Thursday, May 17, 2018
O DESCONVIDADO DE PEDRA
Don Juan:
Aparta, piedra fingida!
Suelta, suéltame esa mano,
Que aún queda el último grano
Em el reloj de mi vida.
(José Zorrilla y Moral - Don Juan Tenório)
___________________________________
silêncio!
é o silêncio que aqui fala
sua palavra de pedra dura
silêncio falado
para calar no fundo
bem além de onde sonha
nossa vã agrimensura
silêncio, gema preciosa da amargura
silêncio amargo em sua própria estrutura
calçado no âmago de sua própria ideia
calcado no íntimo de humana figura
silêncio cuja massa pesa
pendente nessa linha obscura
entre o verbo existir
& a inexistência da carnadura
mas
a este jardim versificado
eu, o silêncio, não fui convidado
coração de pedra
tanto bate até que fura
MC - Don Juan & o Jardim das Maravilhas - 2013
Arte: Imagens do Google
Saturday, April 28, 2018
Monday, April 16, 2018
A EDUCAÇÃO PELA CHUVA
de agulhas
é preciso fixar os olhos
& transfixar as alturas
a chuva ensina
iluminura-se
(lições de chuva )
convectiva
orográfica
habilita à rigidez dos telhados
umidade
enciclopédicas loucuras
&
de oxidação
sabe a chuva
hidrostática
de saber-se rala
sabe também
o fazer-se impura
sabe a chuva
sabe furacão
tem a faculdade inacessível do dilúvio
& a universidade aberta da paixão
leciona pluviometria
& lasciva precipitação
é preciso conhecer
o seu estar para acupuntura
a sua transparente aventura
& deixar-se levar
(sem amargura)
Marcello Chalvinski (Temporal - 2005)
Foto: Images do Google
Labels:
Chalvinski,
chuva,
Educação,
Poesia,
temporal
Tuesday, April 10, 2018
HEBDÔMADA VERTICAL
estou com você caindo do céu
entre lagartos & gritos
para que não fiques aflita
ordeno a ditongos & canivetes
que preparem ramalhetes
de proparoxítonas
duendes & magos
na ortodoxa ortoépia dos mitos
ao meu sinal ábdito
recitam versos-delitos
estou com você caindo do céu
entre lagartos & gritos
o escuro assombroso
da nuvem abaixo
cobre a fantasmagórica
luz da cidade nobre
as casas pobres dos operários
para que não fiques aflita
ordeno a ditongos & canivetes
que preparem ramalhetes
de proparoxítonas
duendes & magos
na ortodoxa ortoépia dos mitos
ao meu sinal ábdito
recitam versos-delitos
estou com você caindo do céu
entre lagartos & gritos
o escuro assombroso
da nuvem abaixo
cobre a fantasmagórica
luz da cidade nobre
as casas pobres dos operários
tombam sobre os jardins ósseos
na escuridão triste
das lâmpadas despedaçadas
mas
cala tua mágoa
a enxurrada posta de pé pelo vento
reduz a distância até os girassóis
vamos velozes por entre os raios
que se engastam
à trombeta dos trovões
lá embaixo
há suaves flores tóxicas
há macios espelhos d´água
há telefones & capim-limão
somos o que vai entre a chuva
perfurando a ventania
em bilhões de orifícios diagonais
atravessaremos juntos
as vidraças do temporal
& solveremos o asfalto das recorrências
infiltrando múltiplas
& sutis incoerências
penetraremos os esgotos
& rasgaremos ávidos
os frios lençóis freáticos
desaguaremos no oceano
meu amor enigmático
& voltaremos como milhões
para este ar de terror & maravilhas
estou com você caindo do céu
entre lagartos & gritos
Marcello Chalvinski - Temporal - Brancaleone Ed. 2005
na escuridão triste
das lâmpadas despedaçadas
mas
cala tua mágoa
a enxurrada posta de pé pelo vento
reduz a distância até os girassóis
vamos velozes por entre os raios
que se engastam
à trombeta dos trovões
lá embaixo
há suaves flores tóxicas
há macios espelhos d´água
há telefones & capim-limão
somos o que vai entre a chuva
perfurando a ventania
em bilhões de orifícios diagonais
atravessaremos juntos
as vidraças do temporal
& solveremos o asfalto das recorrências
infiltrando múltiplas
& sutis incoerências
penetraremos os esgotos
& rasgaremos ávidos
os frios lençóis freáticos
desaguaremos no oceano
meu amor enigmático
& voltaremos como milhões
para este ar de terror & maravilhas
estou com você caindo do céu
entre lagartos & gritos
Marcello Chalvinski - Temporal - Brancaleone Ed. 2005
Monday, April 02, 2018
EU QUE SOU FEIO, SÓLIDO, LEAL
A ti, que és bela, frágil, assustada,
Quero estimar-te, sempre, recatada
Numa existência honesta, de cristal.
Sentado à mesa de um café devasso,
Ao avistar-te, há pouco fraca e loura,
Nesta babel tão velha e corruptora,
Tive tenções de oferecer-te o braço.
E, quando socorrestes um miserável,
Eu, que bebia cálices de absinto,
Mandei ir a garrafa, porque sinto
Que me tornas prestante, bom, sudável.
«Ela aí vem!» disse eu para os demais;
E pus me a olhar, vexado e suspirando,
O teu corpo que pulsa, alegre e brando,
Na frescura dos linhos matinais.
Via-te pela porta envidraçada;
E invejava, - talvez que não o suspeites! -
Esse vestido simples, sem enfeites,
Nessa cintura tenra, imaculada.
...
Soberbo dia! Impunha-me respeito
A limpidez do teu semblante grego;
E uma família, um ninho de sossego,
Desejava beijar o teu peito.
Com elegância e sem ostentação,
Atravessavas branca, esbelta e fina,
Uma chusma de padres de batina,
E de altos funcionários da nação.
«Mas se a atropela o povo turbulento!
Se fosse, por acaso, ali pisada!»
De repente, parastes embaraçada
Ao pé de um numeroso ajuntamento,
E eu, que urdia estes frágeis esbocetos,
Julguei ver, com a vista de poeta,
Um pombinha tímida e quieta
Num bando ameaçador de corvos pretos.
E foi, então que eu, homem varonil,
Quis dedicar-te a minha pobre vida,
A ti, que és ténue, dócil, recolhida,
Eu, que sou hábil, prático, viril.
Poema: Cesário Verde
Arte: Tom Colbie
Tuesday, March 20, 2018
ARMADILHAS
Meu anzol canhoto
Meu taco mestiço
Meu laço de prata
Meu fogo a queimar
Meu fojo profundo
Meu feitiço
Minha verve
Todo meu mundo
Minha arapuca
Meu landruá
Minha rede de arrasto
Meu visgo
Minha tarrafa de asa
Umas garrafas de cabernet
Um blues, meia luz
Meus ardis
Meu alça-pé, meu alçapão
O meu jequiá
A minha armação
Meu isqueiro de aço
Minha emboscada
Uma verdade rasgada
Tudo que tinha
Sem faltar nada
Infinitas maravilhas
Todas as armadilhas
Só pra pegar teu coração.
Poema: Marcello Chalvinski
Arte: Tom Colbie
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